
Branding como elo entre legado e futuro em empresas familiares
Há muitos anos realizo projetos de posicionamento de marca e a maioria deles é para empresas familiares. Muitas vezes, devido à falta de áreas estruturadas de marketing e gestão de marca neste perfil de empresa, várias dúvidas surgem sobre o papel do branding. O que realmente faz, como nasce, como morre, como resolve o problema daquela empresa em particular, que tipo de investimento será necessário. A maior dúvida, porém, surge em como o branding pode conectar o legado das gerações anteriores com os desafios e oportunidades do futuro.
Para responder, faço uma analogia com a navegação, que é a base do nosso método de planejamento de branding. O posicionamento de marca funciona como uma bússola estratégica que aponta a proa em direção aos seus objetivos. O branding não apenas revela ao mercado quem a empresa é, mas também direciona seus próximos passos, desde que enraizado em uma compreensão clara da cultura organizacional, da estrutura de marketing e da maturidade da governança.
Para que isso aconteça de forma eficaz, é fundamental que os sucessores compreendam o DNA original do negócio: o que deve ser preservado, o que precisa evoluir e, principalmente, como traduzir essa herança em atributos de marca que criem vínculos emocionais com novos públicos e mercados.
Mas não há como construir vínculos sem compreender profundamente quem consome, usa, vivencia e depende da marca. Isso exige ir a campo, ouvir com atenção, observar com empatia e interpretar com profundidade o que as pessoas realmente desejam.
Investir em informação, dados e pesquisa deve fazer parte da cultura organizacional, pois é a partir do ponto de vista do consumidor — verdadeiro dono da marca — que se define a matriz de um bom posicionamento. Sem essa escuta ativa, toda estratégia corre o risco de ser construída de dentro para dentro, desconectada da realidade.
Um bom projeto de branding parte de uma liderança convicta de que marca é um ativo estratégico. Sem esse comprometimento top-down, o trabalho morre na gaveta do presidente. Branding, afinal, é no gerúndio: precisa estar em movimento, sendo vivido e aprimorado constantemente em todos os pontos de contato com os públicos. Do propósito ao atendimento, da comunicação à experiência de produto, a coerência entre o discurso e a prática é o que sedimenta a marca no coração das pessoas.
Investir em marca também significa cercar-se de profissionais e dinâmicas que tragam novas perspectivas sobre esse ativo invisível e, ao mesmo tempo, tão valioso.
Já abordei este tema em outro artigo sobre como é raro encontrar especialistas em branding nos conselhos consultivos ou deliberativos das empresas. Este fenômeno revela uma priorização exagerada dos ativos materiais e financeiros, em detrimento da construção de valor emocional que fideliza e perpetua o legado de uma marca.
Este é o famoso brand equity, ou seja, o conjunto de atributos tangíveis e intangíveis que formam as associações e moldam as percepções dos públicos.
Além disso, o posicionamento de marca deve gerar KPIs claros e aplicáveis a todas as áreas da empresa, conectando a visão institucional aos planos táticos do dia a dia. Clareza, conexão com os públicos e cultura de implementação — os “3 Cs” — são os filtros essenciais para validar a consistência de qualquer projeto de branding. E, num mundo cada vez mais competitivo, é essa clareza estratégica que permite à empresa não apenas sobreviver à sucessão, mas prosperar com ela.
Empresas familiares que entendem que marca é reputação, percepção e valor percebido, mais do que o logotipo ou as embalagens dos seus produtos, conseguem fazer da cultura interna um diferencial competitivo. Ao unir legado e evolução sob a lente do branding, constroem pontes sólidas entre passado e futuro, criando marcas que resistem ao tempo, aos modismos e às crises.
Escrito por Zeh Henrique Rodrigues, sócio-diretor de Estratégias de Branding & Varejo da Brainbox.