Living Spaces. O básico bem-feito sempre funciona.
Se existe uma coisa que me chama a atenção aqui nos EUA é o imenso tamanho das lojas de móveis. Concordo que eu não deveria me espantar mais com isso, já que o varejo norte-americano costuma exagerar nas medidas. Uma vez ouvi que os yankees tiram sarro dos brasileiros dizendo que somos um grande país com lojas pequenas. Esse cenário, contudo, já mudou muito nos últimos anos aqui na terra do Tio Sam, principalmente após a pandemia e com o movimento click to brick (varejistas online que migraram para o varejo físico). As lojas diminuíram de tamanho movidas por diversos fatores, como a escassez de mão de obra, custo crescente dos aluguéis e pela melhor otimização do sortimento graças às ferramentas de BI.
Uma curiosidade é que a primeira unidade da Living Spaces foi aberta como um showroom-depósito, numa construção previamente ocupada pela Costco.
A empresa não está nem perto de figurar entre as maiores varejistas do segmento moveleiro, que conta com gigantes como Ikea, Ashley Home e Williams-Sonoma, apenas para citar alguns.
Ela não tem o charme de uma Pottery Barn, o design descolado de uma West Elm ou Design Within Reach, ou a tradição de uma Restoration Hardware ou Crate & Barrel. E nem é essa a proposta. Mesmo assim, consegue ser bem-sucedida na desafiadora tarefa de conferir um certo charme às peças de mobiliário num ambiente com mais de 13 mil metros quadrados. A chance de parecer um mercado das pulgas melhorado ou um atacadão de móveis é bem grande.
Porém, não é isso que se vê.
What’s the twist?
A loja, como um todo, é um conjunto de boas ideias que parecem funcionar bem. Ela atende a questões básicas de uma jornada de consumo ideal. O responsável por essa dinâmica fez sua tarefa de casa bem-feita e conseguiu mapear alguns pontos de atritos do segmento e empacotou bem.
Já na entrada, existe uma estação de café Starbucks para recepcionar os clientes (confesso que poderia estar um pouco mais bem resolvida e ambientada, mas, better done than perfect). A disposição em geral das macrocategorias não tem grandes novidades – e nem imagino como poderia ser diferente. Tudo é bem sinalizado, de maneira clara, com boa legibilidade e visualmente agradável.
A grande atração da Living Spaces, e viável pelas dimensões do espaço, são literalmente quatro casas de estilos diferentes com diversos ambientes mobiliados no centro da loja. O impacto visual é fantástico. Além de quebrar a sensação de vazio de um lugar com pé-direito de 20 metros de altura, cria um ponto focal que ajuda na navegação pelo local. As casas não têm teto, ou seja, quando se está dentro, não fica a sensação de clausura e aperto. Muito bem decorados, os ambientes se dividem em estilos contemporâneo, clássico, country (afinal, estamos no Texas) e hispânico (afinal, estamos no Texas).
O entorno das casas é recheado de microambientes. A loja sinaliza muito bem os departamentos, criando um zoneamento fácil de entender. O espaço kids & teens é um exemplo disso. Outra área que recebeu bastante espaço é a dos quartos e colchões, certamente pela boa rentabilidade dos produtos e grande concorrência nesse segmento.
O hardware utilizado para exposição de sofás e poltronas é inteligente, discreto e funcional, jamais passando a impressão de empilhamento e sobrecarga de mix. Existe oferta de acessórios para manutenção e limpeza dos móveis como produto agregado, bem expostos e organizados. O VM é bem explicativo e tem ícones que ajudam a identificar as características das peças expostas.
Como não poderia faltar, a loja disponibiliza customização de projetos numa bancada no meio do ambiente. Endless Aisle também é oferecido no setor dos tapetes, numa ferramenta intuitiva e funcional.
Como todo bom espaço de varejo físico, também existe uma área de alimentação e um espaço kids. Mas, ao contrário de muitos lugares, não é nada improvisado. O café está mais para um sports bar, com duas grandes TVs exibindo jogos, e cardápio com opções de bebidas alcóolicas e pratos diversos. Um ponto legal é poder descontar seu consumo no café das suas compras de móveis, no valor de até $50. Boa sacada para estimular o consumo. E tudo isso bem integrado ao setor de quadros, superestratégico para quem está sentado curtindo um café e se inspirando para comprar uma peça de arte. Esperto.
O espaço das crianças é enorme. Tem organização de entrada e limite de pessoas para o ambiente se manter saudável. Dentro, existem poltronas para os pais poderem acompanhar confortavelmente seus filhos menores.
Não posso deixar de mencionar os esforços da marca com as comunidades. Além de doações de colchões, trabalha em parceria com diversas ONGs para fornecer projetos e mobiliários a orfanatos, vítimas dos incêndios na Califórnia e veteranos de guerras.
Talvez alguém que conheça a loja e leia este artigo possa até pensar: “Nossa, nunca vi nada de mais nessa loja”. De fato, em comparação com as marcas que citei anteriormente, a Living Spaces não é melhor em nenhum daqueles pontos. Na minha visão, porém, ela consegue harmonizar diversos elementos de uma boa jornada de maneira criativa, simples e funcional.
Precisa mais que isso? What a twist.
Escrito por Zeh Henrique Rodrigues, sócio-diretor de Estratégias de Branding e Varejo da Brainbox.